Quem quer ser um milionário? Golpe do bilhete premiado ainda faz vítimas
Muitos já devem ter sonhado em ganhar um prêmio de loteria, e até projetaram o que fariam com a fortuna. São diversas as opções de jogos: Mega-Sena, Loteria Federal, Lotofácil, Quina, Lotomania, entre outros. E onde há demanda, há criminosos desenvolvendo métodos eficazes para atrair vítimas.
O golpe do bilhete premiado é um dos mais antigos aplicados no Brasil. Pesquise notícias no Google e encontrará milhares de resultados. Não me parece exagero afirmar que há mais vítimas do golpe do que ganhadores dos prêmios verdadeiros.
Loteria existe desde 1784
No Brasil, a loteria teve início em 1784, na cidade de Vila Rica, onde atualmente se encontra Ouro Preto. Vila Rica, à época, era a capital do estado de Minas Gerais. O decreto nº 357, promulgado por Dom Pedro 2º, em 27 de abril de 1844, dava os detalhes de como a loteria iria funcionar em todo o Império.
Avançando um pouco mais, por determinação do então presidente Jânio Quadros, em 1961, a Caixa Econômica Federal passou a ser oficialmente responsável pelas loterias.
A Mega-Sena, por exemplo, existe desde 1996 e sua irmã Mega-Sena da Virada, que aparece uma vez por ano, desde 2008.
Golpe do bilhete premiado é antigo
Existem vagos registros que nos permitem supor que o golpe do bilhete premiado já era aplicado no século 19. De certo, porém, demonstramos que, em 22 de dezembro de 1965, ou seja, há mais de 50 anos, já havia notícias sobre vítimas de vigaristas.
Eu já tratei deste tema nas redes sociais, onde o Tudo Golpe começou, e sempre há, por parte dos leitores, uma compreensiva reação de incredulidade. "Como pode, nos dias atuais, pessoas gananciosas caírem neste golpe?", perguntou um leitor, na esteira de muitos outros comentários similares. Também é comum um posicionamento mais contundente contra a vítima: "Bem-feito", muitos escrevem.
A professora da PUC-SP Bete Adami Santos cita Roberto da Matta para apresentar uma explicação antropológica. "O brasileiro –e, claro, não estou generalizando– acha que o mundo é devedor dele e que tem o direito de receber tudo de graça", diz Adami. A professora é otimista em relação à nova geração: "Eles veem essas coisas de uma outra forma. O dinheiro é meio, e não fim."
Os idosos são as principais vítimas dos criminosos e não há como negar que uma pessoa só se torna vítima por não perceber que a promessa de fortuna fácil só poderia ser um golpe. Afinal, ninguém renunciaria a um bilhete premiado de loteria.
Senhora de 64 anos entregou as joias da família
Em março deste ano, na zona sul de São Paulo, uma senhora de 64 anos entregou as joias da família para criminosos em troca de um suposto bilhete premiado. A idosa estava a caminho do supermercado quando se deparou com uma mulher chorando copiosamente, e parou para ajudar.
Esta mulher mostrou-se muito humilde e disse que havia combinado de encontrar um amigo que ajudaria a encontrar um endereço e resgatar o prêmio de um bilhete premiado, já que ela, por problemas com a documentação, não poderia fazê-lo. O amigo, segundo a narrativa da golpista, não havia aparecido, e ela estava desesperada. Ofereceu, então, R$ 100 mil para que a senhora retirasse o prêmio para ela.
Nesse momento, surgiu um comparsa, muito bem vestido, cumprindo um papel de alguém mais lúcido e esclarecido. Fingindo dar apoio à outra golpista, ele comentou ter ouvido toda a história e sugeriu que ela exigisse alguma garantia de que a senhora não iria fugir com o prêmio milionário.
Foi isso que aconteceu: a vítima foi até seu apartamento, que, não por acaso, ficava próximo ao local da abordagem, pegou as joias da família e as entregou para a golpista, que, como em um passe de mágica, e junto com seu comparsa, a despistou e desapareceu. Câmeras flagraram tudo.
Golpe funciona com pequenas variações
Quase sempre é assim: dois golpistas, o primeiro se mostra uma pessoa mais simples e o outro, alguém mais articulado e com boa verbalização. Juntos, eles criam uma história comovente.
O golpista mais simples aborda a vítima na rua, pede algumas informações e diz que tem um bilhete premiado, mas que tem medo de ser enganado na hora de resgatar o prêmio ou que não tem os documentos necessários para tal. Alguns dizem que que têm ações na justiça que os impedem de receber o prêmio, e há outros que aplicam o golpe pela fé, alegando que sua religião não permite premiação de jogos, por exemplo.
Nesse momento, entra em cena o segundo golpista, dizendo que havia prestado atenção em toda a conversa. Há casos em que até simula uma ligação para um suposto conhecido na Caixa e confirma que o bilhete realmente está premiado.
Sugere à vítima que fique com o bilhete premiado para resgatar a fortuna, mas que ofereça ao comparsa algum bem ou valor em dinheiro, que sirva de garantia que ela, a vítima, não irá fugir com o bilhete e enganar o verdadeiro dono do prêmio, alguém mais "humilde".
O golpe se concretiza no momento em que a vítima entrega o dinheiro ou o bem aos bandidos. Se for preciso fazer um saque, certamente o banco estará próximo ao local, o que não será uma coincidência.
Somente quando for tentar resgatar o prêmio é que a pessoa se dará conta de ter sido vítima de uma armadilha.
Os golpistas acompanham a rotina de suas vítimas. Sabem, inclusive, se estarão com dinheiro no momento da abordagem. Essa escolha raramente é ocasional.
Vítima do golpe processou Caixa e perdeu
Uma vítima, correntista da Caixa, processou o banco por permitir que um montante de R$ 24 mil fosse retirado de sua conta sem a imposição de algumas restrições que teriam, no entendimento dela, evitado seu prejuízo.
A 5ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Maranhão condenou a Caixa, em primeira instância, a indenizar a cliente pelos danos materiais e morais sofridos. O banco recorreu, e a 5ª Turma do TRF da 1ª região, por unanimidade, deu ganho de causa à Caixa.
O desembargador considerou que a Caixa não pode ser responsabilizada pelo prejuízo, material ou moral, decorrente do "golpe do bilhete premiado", se não houve participação dos funcionários do banco.
O relator destacou que, embora a autora não reconheça, ela foi vítima do golpe, tendo em vista que, com o intuito de receber o suposto prêmio da loteria, aceitou comprar o bilhete premiado de outra pessoa, que a abordou nas redondezas de sua casa.
Conto do vigário
O que atualmente chamamos de "golpe", os mais antigos chamavam de "conto do vigário". Lembro de uma conhecida história sobre a origem do termo. Há outras versões, mas essa é bastante popular:
Ainda no século 18, havia uma disputa pela imagem de Nossa Senhora entre os vigários das paróquias de Pilar e da Conceição, em Ouro Preto (MG). Um dos vigários propôs que amarrassem a santa ao burro que estava solto na rua, entre as duas igrejas. A paróquia para a qual o burro se encaminhasse ficaria com a imagem. O animal foi para a igreja de Pilar, que, assim, ganhou a disputa. Mais tarde, porém, foi descoberto que o burro era do vigário dessa igreja.
Encerro esta matéria com um convite. Talvez você, caro leitor, jamais se permitiria envolver em uma situação como esta e esteja se questionando como é que alguém, atualmente, ainda pode cair nesse golpe. Mas a realidade é que o golpe do bilhete premiado ainda faz muitas vítimas e, infelizmente, continuará a fazer.
Compartilhe informações com as pessoas de seu convívio e as ajude a perceber se estão na iminência de cair em um golpe tão rotineiro como esse. Esta é, aliás, minha principal missão com o Tudo Golpe.
Leia também: 'Parece que fui hipnotizada', diz senhora que caiu no golpe do bilhete premiado
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